domingo, 26 de julho de 2009

No túnel do tempo


Vendem-se sonhos (crônica publicada há muuuuuuuuito tempo, na Folha):
Uma coisa sempre me fascinou: o carro do sonhos. Quando criança, na cidade interiorana em que nasci ou no Norte do Estado- quando passava férias com a família- escutava encantada o carro dos sonhos passando. Que tantos sonhos o carro anunciava. De castelos, de fadas e príncipes. Por alguns trocados era possível levar para casa uma nuvem de poesia. Uma montanha de desejos. Voar entre as árvores sem despertar. Um sonho de contos de amor, regado pela inocência das histórias infantis. E ao dormir, sempre um final feliz, garantido pelo carro que passava.
E os carros eram sempre coloridos, acho. Mantinham o porta-malas aberto para caber tanta esperança e magia. ''É o carro dos sonhos que está passando''. Às vezes eram kombis. Daí a imaginação corria solta: os sonhos deviam ser maiores. Escalar o céu e embalar a noite, dormir um sono calmo. Queria logo que chegasse a noite, quando o carro dos sonhos passava. Tinha o carro (ou a kombi) da pamonha, mas esse só servia para aplacar a fome ou a vontade de comer. Bom mesmo era o carro dos sonhos. Esse sim, garantia a felicidade.
Outro dia, nas ruas tumultuadas do centro de Curitiba, escutei um carro dos sonhos passando. Disputava um lugar no trânsito, mas conseguiu estacionar. No lugar do megafone, manipulado ao vivo pelo motorista, um potente alto-falante instalado precariamente sobre o veículo reproduzia uma voz metálica: ''é o carro dos sonhos que está passando''. A frase era a mesma, mas quando cheguei perto, no lugar da magia, vejam só, distribuídos em caixinhas, estavam pequenos pãezinhos doces, recheados com doce-de-leite, goiabada e nata. Pedi um de creme. E devorei em segundos, meu pequeno sonho de infância.

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