quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Pequenos rituais

“Tenha festa no Festejando! Tenha festa no Festejando!”. A menina murmura no carro enquanto passamos por um buffet infantil pertinho de casa. “O que foi?”, pergunto sabendo que lá vem história e que, talvez, fosse melhor ignorar o assunto. Mas vá lá. É segunda-feira. Ela me conta que percebeu que sempre tem movimento quando passamos por lá e que, se acaso um dia não aconteça uma festa, todos os prédios da rua vão cair. Oh!

Tirando o fatalismo da pequena de oito anos, fico lembrando que sempre tive rituais mentais para decidir de grandes a mínimas coisas. Já colecionei fichas telefônicas no bolso. Jogava pro alto. Duas linhas, eu ligava. Uma linha, nunca mais. Que os prédios caíssem, mas nunca usaria o telefone público novamente!Daí inventaram os cartões para acabar com minhas dúvidas e depois os celulares. Nunca joguei meu celular no chão para saber se ligava ou não...

Quando a gente cresce, os pequenos rituais vão se transformado, mas é bonito bonito de ver o quanto construímos as pequenas crenças e carregamos isso com a gente.

Não, filha, os prédios não vão cair porque não houve uma festa, mas o que a gente acredita vai se edificando com o tempo. Desmoronam uns pensamentos, erguem-se outros, independentes das festas lá fora. O bom é que a gente não perca a festa que acontece dentro da gente que o movimento permaneça. Independente das implosões.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Pinturas que a vida faz

Ela disse que jamais me desenharia de olho roxo, mas olho esse desenho e penso que parece um retrato perfeito de alguns momentos. Olhos roxos existem em mim, ainda que transparentes. Olhos roxos aparecem nas pequenas decepções do dia, no cansaço de tentar ser o que é mais aceitável. Tenho os olhos roxos por ti... São “doidos”, na música de Nei Lisboa. Mas tenho os olhos doidos/roxos das coisas que não digo, das coisas que não faço, das coisas que penso e não revelo. Vai transbordando nos poros. Ficando lilás embaixo das pálpebras até aparecerem azulados, roxos, machucados. Eu tenho os olhos machucados, tristes, caídos para baixo. Meus cantos dos olhos não têm visão periférica, tem visão do que está sob. E embaixo do tapete há sempre poeira. Há sempre acúmulo do que ninguém quer mais. Meus olhos têm alergia do pó acumulado embaixo dos tapetes da vida. E ficam roxos...

(*) Ilustração de Helena, cada dia mais representativa.